Assisti hoje um vídeo em que as pessoas contam a coisa mais dolorosa que já ouviram. Comecei a pensar na minha vida, qual a coisa mais dolorosa que já ouvi?
Me lembrei do dia em que meu pai foi em bora, quando eu tinha cinco anos,  minha mãe me disse "Ele vai voltar, é só por um tempo". Esperei todos os dias por um mês pelo meu pai no portão de casa, no horário em que ele voltava do trabalho, até que desencanei. Na época não foi doloroso, mas quando me lembro disso sinto a pior dor que já senti. Acho que depois desse dia me fechei para as pessoas, deixei de confiar nos outros, e me cobro para que eu nunca precise confiar em ninguém. Preciso dar conta de tudo, sozinho. Isso me aflinge ao ponto de eu nunca ter tido um relacionamento na minha vida, em todos os meus 26 anos, nunca trouxe nem mesmo um amigo para casa, não me sinto confortável com alguém invadindo minha vida.
Depois desse episódio, a primeira vez que me machucaram, no ato, emocionalmente, foi alguns anos depois, ainda sem ver meu pai (que só voltaria a ver anos depois) quando um colega de escola me questionou sobre meu pai, contei para ele e outros amigos que estavam conosco, e então um deles afirmou "Então ele não gosta de você". Fiquei sem resposta. Não podia afirmar que ele estava errado, eu nem sabia onde meu pai estava, não falava com ele faziam anos. Ao mesmo tempo, ele nunca me deixou faltar nada, deixava presentes pra mim, que recebia através dos meus avós, e pagava a pensão com um valor até maior do que o estipulado pelo juiz. Fiquei confuso, não saber se alguém com quem eu ainda me importava me amava ou não era pior do que ter a certeza de que a resposta era não. Por semanas isso foi algo que me atormentava, chorei muito depois da escola, passei noites chorando baixinho.
Ficamos quase 10 anos sem quase nenhum contato, meu pai e eu. Quando me perguntavam o que meu pai fazia, com o que trabalhava, onde morava, eu não tinha resposta. Nas poucas vezes que o vi nesses 10 anos nós conversamos o básico para a ocasião, nada pessoal. Quando ele reapareceu, querendo manter contato, acho que eu já não queria mais. Na verdade, não conseguia mais. Tinha me adaptado a ter apenas minha mãe. Me incomodava ter que dar satisfações para ele, me sentia violado quando ele acessava minha vida. Ao mesmo tempo, não queria que ele fosse em bora, de novo. Deixei de contar para ele sobre minha sexualidade, sobre meus problemas, sobre minhas dificuldades, com medo de que qualquer um desses fatores fossem o suficiente para que ele se afastasse de mim.
Quando amadureci, percebi que era bom tê-lo por perto, mas que não dependia dele, nunca dependi. Penso as vezes na possibilidade da morte, como qualquer pessoa, penso no dia em que o perder, e queria muito sentir sua perda, mas não consigo. Choro muito pensando nisso, no monstro em que me tornei. O filho que não sente a perda do pai. Hoje o que me aflinge não é mais a distância, a falta, o medo da perda... mas o fato de que eu quero sentir tudo isso, eu quero me aproximar e voltar a confiar nele e nas outras pessoas, mas eu simplesmente não consigo, e isso dói, de novo.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog